RUMOS DA AUDITORIA EM SAÚDE – INFLUÊNCIAS E DETERMINANTES

 

*Maria Aparecida de Oliveira e Cecília Maria Soares Carvalho Oliveira

 

O desenvolvimento do segmento suplementar de saúde, ora como modelo predominante ou como serviço paralelo e complementar aos oferecidos pelos sistemas públicos nos diferentes países, produziu significativa influência sobre a configuração da auditoria em saúde. A partir dos anos 70, no Brasil, à medida que cresceu e se organizou o subsistema suplementar, cresceu também a incorporação do auditor de saúde nesse setor.

 

A inserção da auditoria com forte conotação contábil na rotina administrativa das seguradoras e operadoras de saúde permeou os bastidores dessa evolução, pois as instituições precisam comprovar aos órgãos reguladores e à sociedade sua capacidade de liquidez e condições econômicas de honrar os compromissos junto aos usuários. Esse é o funcionamento do mercado suplementar de saúde. Predominam no modelo suplementar relações determinadas pelo capital, nas quais, muitas vezes, estão evidenciados polos antagônicos, representados pelos empresários, pelos trabalhadores de saúde e pelos usuários, cada qual com objetivos distintos entre si. Nesse território, que impulsionou o campo de trabalho do auditor de saúde afloram características que irão influenciar de alguma forma o próprio objeto da auditoria.

 

É perceptível que no contexto da saúde suplementar a auditoria esteja focada em oferecer suporte técnico aos gestores para elaboração de pacotes assistenciais, pareceres sobre tabelas, taxas, diárias hospitalares, procedimentos e controle da rede credenciada. Ou seja, sob o domínio de uma visão de mercado, a auditoria em saúde vem atuando desde a fase da avaliação das solicitações dos procedimentos na central de liberação até atingir a identificação de distorções nas contas médico-hospitalares, para fins de pagamentos, promovendo correções e buscando um aperfeiçoamento do atendimento médico-hospitalar ou ambulatorial da rede de prestadores de serviços (OLIVEIRA, 2009).

 

Mas, é preciso considerar que a saúde suplementar não criou por ela mesma uma nova forma de auditar. Qualquer modelo teórico pode direcionar ou subverter a conformação de uma prática de avaliação e controle ou de uma prática de saúde. Como exemplo tem-se a abrangência das concepções da auditoria no sistema de saúde do Reino Unido, mais especificamente, da Inglaterra.

 

A esse respeito, Buxton (1994) descreveu uma contextualização ampliada das dimensões alcançadas pela auditoria no National Health Service (NHS), afirmando que “(...) as reformas do NHS impulsionaram a tecnologia emergente da auditoria médica em uma nova fase da sua difusão”. Ou seja, no âmbito das reformas do NHS a auditoria foi sistematicamente endossada e percebida por todos como uma atividade que merece apoio e incentivo. Constituiu-se, pois, em um conjunto de ferramentas de tecnologia organizacional para a análise sistemática e crítica da qualidade dos cuidados médicos, incluindo os procedimentos utilizados para o diagnóstico e tratamento, e a aplicação de recursos frente aos resultados obtidos para o paciente.

 

Embora, o próprio sistema inglês perceba algumas consequências da amplitude conceitual adquirida pela auditoria, há  referências de que estudiosos teimam em posicioná-la em uma perspectiva grandiosa, como a terceira ciência clínica, com a sua própria teoria, técnicas e literatura, objetivando alcançar uma melhor qualidade de atendimento por meio de mudanças contínuas na prática e amplo papel educativo. Fica patente que os rumos da auditoria em saúde foram influenciados por um cenário interno ao sistema de saúde inglês, representado pela necessidade de reformas estruturais no modelo de atenção.

 

De volta ao sistema brasileiro de saúde suplementar, pode-se falar de uma fase anterior à regulamentação do setor e outra pós-regulamentação, nas quais a auditoria apresentou realidades e abrangências distintas. Antes da criação da Agência Nacional de Saúde (ANS) e da regulamentação dos planos e operadoras de saúde pela Lei 9656/1998, a auditoria limitava-se muito mais à apreciação das contas médicas. Posteriormente, a abrangência da auditoria foi ampliada às questões contábeis para comprovar a sustentabilidade das operadoras no mercado, como também à assessoria gerencial e à qualidade do atendimento. Não se trata, portanto, de uma nova forma de auditoria, mas de uma nova cultura em construção, a qual tem e terá influências marcantes na configuração científica e técnica da auditoria em saúde.

 

Este é um paralelo que pode ser elaborado, comparando-se diferentes determinantes presentes no sistema inglês e no subsistema suplementar de saúde no Brasil. A partir destas análises, verifica-se que para entender a prática da auditoria é necessário pensar qual a estratégia ou a ideologia presente no projeto que a determina; quais são seus valores, princípios e metodologias. Nesse contexto, é preciso ter claro também os papéis dos profissionais que atuam nesse substrato - que ações lhes são possíveis no processo, de que forma se relacionam, quais hierarquias e estruturas de poder estão presentes, e como sua conduta clínica é permeável a essas intervenções.

 

O comportamento da auditoria de saúde, portanto, não é o mesmo nos diferentes modelos assistenciais, exigindo dos profissionais, das instituições que representam as profissões, da academia que forma esses trabalhadores e da própria ciência um olhar de compromisso com a autonomia necessária a essa prática, à estrutura e organização da atividade e aos pressupostos teóricos que devem estruturá-la.

 

Autoras:

Maria Aparecida de Oliveira

Cecília Maria Soares Carvalho Oliveira

Coordenadoras do curso de especialização à distância em auditoria odontológica da PUC Minas Virtual.

Bibliografia

BUXTON, Martin J. Achievements of audit in the NHS. Quality in Health Care. v.3, p.31-34, 1994.

 

OLIVEIRA, Valter Luiz. Relato histórico da auditoria e sua aplicação no SUS e nas operadoras de saúde suplementar. Monografia. 34f. especialização em Auditoria e Gestão em Saúde. Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, 2009.

Assuntos relacionados: Auditoria Interna, Auditoria Interna Operacional Auditoria Trabalhista, Auditoria na Terceirização, Relatórios de Auditoria


4ª Oficina Prática de Auditoria Interna - em São Paulo - SP

 

   Veja mais assuntos publicados sobre Auditoria Interna

Contextualizando a Auditoria em Saúde a partir de suas raízes contábeis

A aplicabilidade da Auditoria na área da Saúde - entre a fragmentação e a integração

Objetivos e finalidades da Auditoria Interna Operacional

A auditoria operacional exige profissional qualificado nos aspectos administrativos

Diferenças Básicas entre Auditoria Contábil e Auditoria Operacional

 

Cursos relacionados

Auditoria Interna e Controles Internos em Tecnologia da Informação

Como Elaborar Papéis de Trabalho, Pareceres e Relatórios de Auditoria Interna

Oficina de Auditoria Interna

Planejamento Tributário - Pis e Cofins - Supermercados

Planejamento Tributário - Pis e Cofins - Indústrias

Outros cursos de Auditoria

Veja também outros cursos previstos para São Paulo | Belo Horizonte | Curitiba | Rio de Janeiro | Cadastre-se